Desde há alguns anos, os sons que nos vão chegando dos quatro cantos do mundo têm mudado de estatuto. O interesse etnográfico pelas práticas musicais dos povos não-europeus foi pouco a pouco sendo substituído pelo aqui e agora de uma nova experiência de escuta, que se quer aberta à diversidade das práticas sonoras, para lá das fronteiras políticas e culturais. É a esta tendência, a este ideal de uma música "sem barreiras", que se tem dado o nome de "world music".Estranhamente, este fenómeno tem merecido pouca reflexão por parte das ciências humanas, e em particular pelas que se dedicam precisamente ao estudo das práticas musicais. Várias razões explicam este incómodo:por um lado, a "world music" foi antes de mais uma invenção da indústria cultural, reunindo um universo heteróclito de práticas musicais, e, por outro, nela confluem e se projectam um conjunto confuso de discursos de estatuto muito diferente (pós-modernismo, multiculturalismo, New Age, ecologia, pacifismo, ajuda humanitária, direitos humanos, etc.). As tensões que percorrem esta nova maneira de ouvir e fazer música são, no entanto, fundamentais para a compreensão da nossa escuta contemporânea. O que é a "música do mundo"? Uma procura de autenticidade ou um fascínio pelo híbrido? Uma aposta na diversidade ou uma tendência para a normalização? A recusa da música comercial ou a criação de um novo mercado discográfico? Qual a sua relação com as novas tecnologias de composição e de escuta? De onde vêm, qual a sua história, quais as suas raízes? Que efeito têm nas identidades musicais nacionais? E o que é isto de identidades musicais nacionais? E de que "mundo" nos falam estas músicas? O da economia neo-liberal globalizada, ou o das resistências alter-mundialistas? Do fim das barreiras entre os povos ou do refúgio identitário? Este encontro pretende reunir especialistas da etnomusicologia, da musicologia e de outras ciências sociais para discutir algumas das questões levantadas pela ambiguidade deste processo, associando igualmente à discussão os diferentes actores – músicos, críticos ou programadores – que têm procurado trazer e difundir as "músicas do mundo" no nosso país. [Manuel Deniz Silva]
No Centro de Artes de Sines (CAS), dia 16 de Julho. Uma organização da Câmara Municipal de Sines e do INET (Instituto de Etnomusicologia da Universidade Nova de Lisboa) com a coordenação científica de Manuel Deniz Silva. Entrada livre.
12h00-13h30: O QUE É A "WORLD MUSIC"?
- Manuel Deniz Silva (INET-MD): Globalizações musicais
- Pedro Moreira (INET-MD): “Gravando a diferença": uma perspectiva histórica da World Music
15h30-17h30: MÚSICA, CULTURA E NAÇÃO
- Salwa Castelo Branco (INET-MD): Os processos de folclorização musical em Portugal
- Nuno Domingos (SOAS, Londres): Produção cultural e Ideologia: o caso da ópera do Trindade (1963-1975)
- José Neves (ICS-UL): Um Mundo de Culturas: Fernando Lopes-Graça e outros Intelectuais Comunistas
18h00: Mesa-Redonda: Música Portuguesa e globalização
com José Mário Branco (músico), Chullage (músico), Pedro Rodrigues (musicólogo e jornalista do Público).
Nenhum comentário:
Postar um comentário